No dia 20 de janeiro de 2018 aconteceu
algo inédito comigo, meu avô falecido a mais de 20 anos veio simbolicamente em
meu sonho transmitir uma mensagem. Meu lance com sonhos sempre foi bem intenso,
mas nunca me dediquei a depositar grande valia sobre, devido a dificuldade de
decodificação presente no inconsciente. Porém desta vez, aliado a uma rápida
pesquisa na internet pude formar uma leitura da mensagem.
Sempre fui uma pessoa difícil de
conviver, tenho consciência disso e numa ânsia de me aprimorar como pessoa,
creio que tenho chegado a estágios de autoconhecimento muito relevantes. Através
principalmente das leituras de Nietzsche, dos gregos antigos e de textos
budistas pude me conectar mais com minha própria natureza para assim tentar
dominá-la; ora com mais dificuldade, dor e conflito, ora mais facilmente; mas
nunca é fácil, pois como me ensinou Empédocles, as forças antagônicas do mundo
é que nos forjam, e assim sigo sendo forjado. Todavia entender o rizoma de
Deleuze me faz ter relações muito mais saudáveis do que quando minha fé num
cristianismo platonismo me fazia obrigatoriamente assumir certas certezas. E é
justamente a estrada percorrida que vai nos fazendo eliminar as certezas.
Outra coisa que costumo estudar a
certo tempo são as artes marciais, é minha ligação mais forte com qualquer
cultura oriental. Confesso que sou muito ocidental, meu comportamento, minhas
atitudes, minha “aparência”, mas se tem algo que pude fazer como brasileiro
antropófago que sou é aderir a aspectos da filosofia oriental. O próprio termo
filosofia parece tomar outro sentido quando nos referimos aos povos de lá, tem
mais a ver com o ethos, que com uma definição de amar o conhecimento.
Habito minha própria casa, diria
Nietzsche, os textos budistas me ajudam a estar presente, ou seja, ser consciente
do agora. Nas artes marciais japonesas existe o lugar onde se desenvolve certa técnica,
mas não é só isso, como no caso da luta transformada em esporte, e sim o lugar
do aprimoramento pessoal; este lugar se chama Dojo. A tradução do termo é “local
do caminho” e é considerado a própria casa dos praticantes. O termo nasceu no
zen-budismo já que era o local onde os monges meditavam, mas também exercitavam
o corpo.
Paulo de Tarso não conheceu Jesus,
apesar disso ele é o cara que praticamente fundou as bases do cristianismo de
viés platônico, sendo este o viés mais poderoso de tal religião. Na primeira
carta que este escreveu ao povo de Corinto ele diz de modo extremamente
idealista herdando assim a separação do nosso existir aqui de um existir ideal
e perfeito presente em outro lugar, quando diz que o corpo é o templo do Espírito
Santo e não nosso. Esse novo modo de relação com a vida com certeza causou
grandes problemas ao nosso ocidente, inclusive desvirtuando comportamentos, nos
permitiu criar tantas outras leituras dualistas de mundo, deslocando os valores
do presente e do um, para os poderes externos, grande exemplo disso foram as
teorias comunistas e socialistas que vieram para substituir o deus morto
pós-iluminista, como nova moral.
Moral é um termo latino, ele deveria
ser a tradução de ética, porém este povo ao criar o novo termo esqueceu o sentido
etimológico do ethos, que é o habitar. Na moral já não habitamos, mas ao modo
platônico transferimos nossos valores aos que um poder julgou ser o bem maior.
Viver dez anos com outra pessoa
também me ensinou muito a duras penas, tentar construir valores convergentes
entre dois para uma relação que nas suas vontades e interesses pudessem dar
mais alegrias que tristezas. Isso implica abdicar de certos aspectos da
natureza do indivíduo, tanto porque criamos tamanho afeto por outrem que assim
o fazemos, achamos que na balança tal esforço vale.
Quando finalmente achamos que tal
empreitada já não vale, o fim parece algo normal, deste que venha com saúde. A mesma
saúde que busco para o meu eu, para o meu hábito, busco para as relações que
julgo importantes a mim e se assim o são, as valorizo.
Das quatro pessoas mais próximas que tive em toda minha vida, por três
delas fui ultrajado violentamente nos últimos dias, porém a última foi um golpe
fatal porque era a única em que eu realmente acreditei que existia certa
aproximação desses hábitos, justamente por ter vivido tanto tempo dividindo
quase tudo. E aí vem a grande lição da vida em Nietzsche, os níveis de
interesse existentes nas relações humanas e a prova da falácia platônica.
As palavras são maneiras que criamos de interpretar as coisas que vêm até
nós, mas não são qualquer realidade. Se é pelo diálogo que nossa espécie chega
a algum lugar, as mesmas palavras que são usadas para criar esperança,
conquistar e adquirir, são usadas para destruir. A palavra não possui valor
qualquer em si, ela é um mero meio de conquistar o que interessa ao que deseja.
Sendo assim se por elas projetamos o amor da nossa vida, em 24 horas
transformamos o mesmo objeto em lixo e o descartamos se nosso interesse
reverteu o desejo em repulsa.
Donna Haraway no seu feminismo cyborg nos fala que a grande vantagem
deste sobre o feminismo marxista é o não dualismo das relações, pois segundo
ela e o próprio Deleuze, cada relação tem sua própria política, digamos assim,
onde as regras são específicas em cada contrato de relação. É o jogo da vida
com regras acordadas, porém quando se tem uma relação mais longa e intensa esse
jogo fica mais complexo, fazendo com que as regras precisem ser atualizadas e
modificadas, é normal, vemos isso na evolução dos esportes, por exemplo.
A desonestidade está justamente em acordar as regras e no meio do jogo
querer mudá-las porque seu time está perdendo, é o espírito antidesportista daquele
que não aceita a derrota no jogo, sendo esta parte inerente da evolução pessoal
ou de qualquer coisa, lembremos Empédocles novamente. E aí entra o jogo de
poder, quando a moral sobressai às relações contratuais, o que ocorre com os estados
totalitários é o mesmo que ocorre na pelada de rua, ou seja, o desonesto
(desonesto por não buscar o autoconhecimento, mas ainda assim querer chegar não
em seu destino pessoal, mas onde ele possa ser intocável, independente da
condição que isso implica ao próximo) não aceitando a possibilidade de perder
por não ver na derrota a natureza do jogo e extrair dela condições para evoluir
na técnica pessoal, tendo este o poder, sendo o dono da bola, ele simplesmente
a segura em seus braços e vai pra casa, dando fim ao jogo sem o comum acordo de
todos os participantes.
O grande ensinamento do Dojo é este, o de respeitar o espírito das artes
marciais, sendo o local do caminho ele nos indica que habitamos este caminho
que leva à iluminação, nós nunca lutamos contra outro, a luta é pessoal, a
derrota é pessoal, àquele que não aceita a derrota é alguém que não conhece a
si mesmo, aquele que deseja o poder é desonesto com a espécie porque pode usar
de meios para benefício próprio, e este é incapaz de fazer uma reverência tanto
ao Dojo vazio quanto ao semelhante.
O caminho para a iluminação é um querer pessoal daquele que entende a harmonia
que há no mundo físico. Se Nietzsche nos fala de modificarmos o mundo através dos
valores da nossa existência é que somos seres ativos junto ao mundo vivo,
enquanto a espera no ideal estático das ideias não passa de uma morte em vida.
Portanto, se nosso objetivo é o aprimoramento pessoal quer dizer que o
que fazemos é positivo ao mundo em que vivemos como um todo e isso implica
todos os outros seres vivos e as matérias inanimadas que nos relacionamos se
estendendo ao infinito.
Feliz aquele que compreende a mensagem.
Diego Marcell
21/01/2018
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